Questões em aberto sobre a Biblioteca da Casa Kozák

15.7.14


No dia 1º de Setembro de 2014 a Biblioteca da Casa Kozák completará seu terceiro ano desativada e fechada ao público. Ela esteve fechada e abandonada durante 1 ano e 3 meses na gestão municipal anterior, e 1 ano e 10 meses na atual gestão municipal de Curitiba, totalizando 2 anos e 10 meses de biblioteca fechada ao público no bairro Uberaba. Foram duas gestões diferentes da prefeitura e duas presidências diferentes da Fundação Cultural de Curitiba e a biblioteca continua fechada ao público.

Em maio de 2014 a Biblioteca da Casa Kozák teve o seu interior invadido e depredado, e nós fizemos um longo artigo com fotos ilustrando a situação em que a biblioteca se encontrava. Leia o post "Tristes detalhes do interior da Casa Kozák" e saiba como estava o local.

Somente após esse triste episódio, e após a nossa denúncia, foi que a Casa Kozák recebeu tapumes para evitar que novas invasões ocorressem ao edifício que é bastante antigo, e sofre também com a falta de manutenção e com a ação do tempo. A placa da foto acima foi deixada para trás dentro da biblioteca, e nenhum dos dois órgãos consultados se responsabilizam por ela ou pelos outros objetos que encontravam-se em seu interior na época da invasão.

Em resposta à indagação do blog Bibliotecas do Brasil sobre os objetos deixados no interior da Casa Kozák, a Fundação Cultural de Curitiba respondeu via Facebook:
"Com relação ao acervo lembramos que os objetos que pertenceram ao cineasta Vladimir Kozák são de responsabilidade da Secretaria Estadual da Cultura. Atenciosamente Coordenação de Comunicação da FCC".

Procuramos a Secretaria de Estado da Cultura (SEEC) com a mesma indagação, e o órgão nos respondeu o seguinte:
"Esclarecendo, não há nenhum objeto do acervo Kozák, com exceção do carro, dentro da casa. O que resta dos móveis e demais materiais faziam parte da biblioteca. Os bens móveis de Vladimir Kozák, destinados ao Museu Paranaense pela justiça, integram o acervo do museu desde o final dos anos 1970 e se encontram em bom estado de conservação, organização e catalogação, estando em processo de digitalização e inscrição no sistema Pergamum, é possível ter acesso ao que já foi cadastrado por meio do link www.memoria.pr.gov.br. Já o carro, pela falta de recursos, infelizmente escapa dessa condição. Sobre a referida placa, ela foi dada pela PMC (há a logomarca de Curitiba 300 anos, como se vê na foto) tendo sido dada à casa quando esta já era biblioteca municipal, não fazendo parte do acervo do homenageado. Qualquer dúvida, estamos à disposição. Atenciosamente, Bianca. Assessoria de Comunicação Secretaria de Estado da Cultura do Paraná." 
O carro de Vladimir Kozák virou sucata no quintal de sua casa no Uberaba.

Terreno da Casa Kozák

Não será possível à Prefeitura Municipal de Curitiba e a Secretaria de Estado da Cultura que trabalhem em conjunto e colaborem entre si de forma concreta para favorecer a conservação do que resta da Rural Willys de Vladimir Kozák, para que as gerações futuras possam aprender a respeitar e apreciar essa herança cultural deixada ao bairro Uberaba e à cidade de Curitiba, já que as gerações atuais não podem nem ter contato com esse legado?

Vladimir Kozák foi um grande estudioso dos índios Xetá

Os índios Xetás foram quase dizimados por aqueles que queriam colonizar suas terras para o plantio de café na região noroeste do Paraná nas décadas de 1940 e 1950. Em 1956 Vladimir Kozák foi o fotógrafo e cinegrafista da expedição que travou contato com estes índios, e até hoje é lembrado como o homem que os fotografou pelos sobreviventes dessa tribo que visitaram sua casa em 1994, como descrito na placa abandonada no local. Confira a história dos índios Xetás nesse excelente documentário curta-metragem produzido pela WG7BR em 2010:


Encontramos também esse texto que nos conta um momento marcante da história da Biblioteca da Casa Kozák:
Em maio de 1994, o Círculo de Estudos Bandeirantes recebeu a visita de índios xetás. Durante três dias em Curitiba, os xetás visitaram a Universidade Livre do Meio Ambiente, viram exposição e exibição de filme na Universidade Federal do Paraná e visitaram a Biblioteca da Casa Kozák,432 da Fundação Cultural de Curitiba. Visitaram o Museu de Arqueologia e Etnografia de Paranaguá, o acervo etnográfico do Museu Paranaense e do Círculo de Estudos Bandeirantes e passearam pela cidade de Curitiba.
Na visita ao Círculo, o grupo de índios veio acompanhado pela pesquisadora e professora de Antropologia Blanca Guilhermina Rojas e funcionários da FUNAI e foi recebido pelo diretor do Círculo, professor Sebastião Ferrarini, e pelo presidente da ESIMPAR, professor Gotardo Ângelo Gerum.
Os visitantes xetás eram Tucanambá José Paraná, 47 anos; Kuein Manhaa’ei Nhaguakã Xetá (João), 60 anos; Tikuein (José Luciano da Silva), 44 anos; Claudemir da Silva (filho de Tikuein), 7 anos. Identificaram xetás em diversas fotos tiradas por Vladimir Kozák durante expedições de pesquisa do Dr. José Loureiro Ascenção Fernandes433 nos idos de 1950. Nenhuma das fotos trazia até então a identificação das pessoas registradas.
- Páginas 270 e 271 do livro Círculo de Estudos Bandeirantes Documentado de Sebastião Ferrarini, editado em 2011 pela Editora Universitária Champagnat.


Se a Casa Kozák era a única biblioteca no Uberaba - o quinto maior bairro de Curitiba, com população de 72.056 habitantes segundo o Censo 2010 - localizado na periferia da cidade, onde os recursos na área da leitura e a diversidade de empreendimentos culturais são escassos e/ou inexistentes, por que ela não foi considerada como prioridade no orçamento do setor de cultura para ser conservada e preservada?

Garante-se a preservação fortalecendo as bibliotecas e garantindo que sejam realizadas medidas prévias de conservação, para que se assegure a continuidade delas e para que não sejam levadas ao fechamento definitivo ou por tempo indeterminado.


Fotos abandonadas no interior da Casa Kozák que foi invadida e teve seu interior depredado no mês de maio de 2014.


Objetos e móveis foram deixados para trás no interior da Casa Kozák, são peças que remetem à diferentes épocas do imóvel. Ainda estão em seu interior os materiais utilizados no dia a dia da biblioteca (potes de tinta, pincéis, quadros negros), móveis (um deles chamou mais a atenção, o balcão com uma vitrine com ilustrações deixadas em seu interior) assim como objetos ligados à memória de Vladimir Kozák que poderiam ter sido reutilizados em outros espaços culturais da cidade, como a placa em homenagem à visita dos índios Xetá à Casa e o seu carro, uma Rural Willys completamente enferrujada e sem proteção no quintal dos fundos. (Leia o artigo na íntegra)

Até hoje não foi publicada nos sites oficiais e redes sociais dos órgãos responsáveis pelas duas bibliotecas que estão fechadas ao público desde 2011 (Casa Kozák e Casa da Leitura Franco Giglio) uma lista detalhada sobre o atual estado de conservação delas, sobre a natureza das intervenções pelas quais elas precisam passar, nem foi informado o orçamento discriminativo que será destinado aos reparos e reformas.

Com estas dúvidas em mente e com o intuito de lançar luz sobre o assunto, elaboramos quinze perguntas para serem respondidas pela Prefeitura Municipal de Curitiba. Enviamos as questões no dia 08/07/2014 (há 7 dias) e não obtivemos resposta até hoje (15/07/2014). Enquanto continuamos aguardando as respostas, abrimos as perguntas aos leitores do Bibliotecas do Brasil, pois é do interesse público que elas sejam respondidas e justificadas. 

Deveria ser de extrema prioridade para aqueles que detêm a responsabilidade pelos bens culturais de nossas cidades, como são as bibliotecas públicas, fazer o necessário para preservá-las, protegê-las da depredação e da ação do tempo, conservá-las para que elas possam ter continuidade, e deixar sempre às claras de maneira acessível e fácil de serem consultadas todas as informações sobre a atual situação delas, os projetos para o futuro discriminados, os prazos para realização desses projetos determinados, além de fornecerem alternativas nos próprios bairros para que a comunidade não perca o vínculo físico e sentimental com esses espaços culturais enquanto eles aguardam as reformas, restauros e reparos.

Depois que uma biblioteca é fechada ao público, é muito difícil que reabra novamente. Quantas gerações de possíveis novos leitores já passaram pelo bairro Uberaba nesses 3 últimos anos sem a presença e o estímulo de uma biblioteca ativa e atuante no local?



Seguem as perguntas abaixo que enviamos à PMC, se alguém se sentir à vontade para nos ajudar à respondê-las, pode entrar em contato através do nosso email contato@bibliotecasdobrasil.com

Perguntas para a Prefeitura Municipal de Curitiba e Fundação Cultural de Curitiba


  1. Por que não foram adotadas medidas de manutenção regular para assegurar a conservação e o funcionamento da Casa Kozák e evitar o fechamento?
  2. Por que não foram tomadas medidas de conservação de emergência para garantir pelo menos o funcionamento parcial da biblioteca e optou-se pelo fechamento definitivo?
  3. Por que não foi publicado em jornais e no próprio site da PMC/FCC e levada ao público com antecedência a notícia sobre o fechamento da Casa Kozák? Essa informação foi publicada no site somente na véspera do fechamento.
  4. Além dos tapumes, que outras providências foram tomadas para evitar que a Casa Kozák continue se deteriorando?  
  5. Foi providenciada uma limpeza e feita a desinfecção da Casa Kozák, visto que ela estava infestada de fezes de pombas (o teto e o assoalho do segundo andar) bem como o banheiro que estava todo urinado e defecado pelas pessoas que invadiram o local? Fotos: http://www.bibliotecasdobrasil.com/2014/05/tristes-detalhes-do-interior-da-casa.html
  6. Foi providenciada uma proteção para a Rural Willys, carro de Vladimir Kozák que encontra-se no quintal?
  7. Solicitamos à Prefeitura Municipal de Curitiba e à Fundação Cultural uma listagem atual detalhada sobre as condições estruturais da Casa Kozák.
  8. Solicitamos a descrição das intervenções consideradas necessárias: será feita uma reforma, restauro ou a edificação de um novo prédio? Se for reforma ou restauro, serão parciais ou completos? Ou será feita a demolição da Casa Kozák para que outro prédio totalmente novo seja edificado? 
  9. Solicitamos a descrição das despesas orçamentárias que serão necessárias para essas intervenções.
  10. O croqui do projeto que o vereador Hélio Wirbinski tem divulgado em seu site é legítimo? (http://www.heliowirbiski.com.br/noticia/14-03-2014/emendas-para-reforma-da-casa-kozak
  11. Se é legítimo, por que esse croqui não está publicado no site da PMC, nem no site da FCC e nem no site do IPPUC (sendo que o nome do órgão está no croqui)? 
  12. Por que o projeto não mantém os contornos arquitetônicos antigos originais da Casa Kozák, o estilo tcheco, as características da Casa e seus elementos? 
  13. Quem assinou o projeto? 
  14. Onde ele está disponível para consulta e informações? 
  15. Por que a grafia do nome “Kozák” está errado no projeto?

Daniele Carneiro e Juliano Rocha - Bibliotecas do Brasil
contato@bibliotecasdobrasil.com
Fotos: Daniele Carneiro e Juliano Rocha.
Arte: Juliano Rocha

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1 comments

  1. Daniele Carneiro, fiquei emocionado com o seu texto. Sinto muito carinho por esse espaço e estava triste com a situação de abandono em que ela encontrava-se. Nessa semana (jul/17) visitei a casa e fiquei feliz de ter sido reaberta. Só a questão da Rural Willis e de algumas modificações na casa (perdendo algumas características originais) me deixaram meio com o coração na mão. Mas ela foi reaberta, isso é que importa. E acredito que o seu artigo tenha sido relevante, na virada para melhor, daquela triste situação. Um abraço, e obrigado.

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